Já esqueci a mulher que eu amava.
O seu nome, da boca e dos ouvidos
me perdeu os sentidos:
apagou-se
a chama que a chamava.
Por fim, não lembro nada
de minha namorada.
Já se acabou em mim sua beleza.
Fiquei nu de seu corpo.
Morri sua natureza.
Ignoro se ela existe,
se o ser a conheceu,
se saiu do presente
ou se a nós dois também sobreviveu.
Sim, olvidei a que me cativou
e já não sei de mim como a queria
- mas, despropositado, o amor ficou
depois de tudo
cego de razão
e nunca me abandona:
com um sorriso que aperta o coração
a me doer o mundo,
atira-me na lama, e se lamenta
de mentira comigo.
É um mágico inimigo
que a ferir-se me atinge:
sofre tudo que finge
o santo vagabundo.
Eu xingo esse infeliz
maldigo o excomungado
que me espanta e me faz
chorar desesperado
Mas depois o consolo
com medo de o perder
quando vejo que foge
o divino pirata
e lhe invento razões
para me enlouquecer.
Um dia, ele me mata.
Nota: Escrevi este poema muito tempo atrás, em minha remota juventude. No milênio passado, evidentemente. Acho que tem um quê de bolero, ou de tango, de sinceridade fingida. Não me reconheço no estilo. Tampouco sei explicar porque a rapsódia é azul. Quase nada conservo do que escrevi naquela época. Da maioria dos textos nem me lembro. Mas guardei, não sei por que, a recordação da esquecida.